Homenagem Póstuma Anita Novinsky

Lina Gorenstein e Eneida Beraldi Ribeiro

Pesquisas da professora Anita Novinsky, desde meados do século XX, mudaram as concepções historiográficas tradicionais sobre o Brasil e trouxeram para a discussão novos elementos para a sua compreensão: a ação inquisitorial do Tribunal português e a presença dos cristãos novos na construção da colônia.

O conjunto de sua obra foi reconhecido em vida, tendo recebido, da Universidade de São Paulo, o título de professora Emérita no ano de 2017. O Conselho Nacional de Desenvolvimento, CNPq a considerou uma “Pioneira da Ciência”, dentre outras mulheres excepcionais e a Universidade Federal Rural de Pernambuco criou a uma cátedra em sua homenagem, além de diversas outras distinções por instituições internacionais, como a de "President's Award” da Universidade de Netanya de Israel.

A historiadora introduziu conceitos essenciais para a historiografia moderna como o de “homem dividido” (aquele que vivia em um mundo ao qual não pertencia), a ressignificação do marrano, as “sociedades secretas”, a “cultura do segredo” e definiu o colono brasileiro, o paulista bandeirante, como o “novo homem moderno”.

Em balanço sobre a produção historiográfica contemporânea, Anita afirmava que a “Nova História da Inquisição”, com a ênfase nos dados estatísticos e quantitativos “minimizava a ação e o papel da Inquisição”, desaparecendo o homem e seu sofrimento. Em mais de trinta anos de pesquisa nos arquivos da Inquisição, e em quase todos os arquivos europeus, ela preferiu estudar o mundo dos encarcerados e seus rostos sociais, ou seja, os seus lugares de fala. Suas pesquisas resultaram em livros de inventários de documentos1. Na leitura dessa documentação, Anita separou os relativos aos presos vindos do Brasil, construindo um acervo documental único.

Novinsky inovou também com o conceito de “pária marrano”. O pária, estigmatizado pela pureza de sangue, que vivia em um conflito insolúvel, sem identificar-se com a sociedade ampla, mas ao mesmo tempo querendo a ela pertencer. Ela também buscou as defesas que se faziam ao Tribunal inquisitorial, mas encontrou um leque de pensadores que se contrapunham ao funcionamento da Inquisição, como o Padre Antonio Vieira a quem dedicou parte de sua vida.

Viver em tempos da Inquisição é obra que reúne alguns de seus textos mais significativos, sendo a Inquisição e o antissemitismo as bases de seu trabalho. Publicou análises sobre Machado de Assis e Fernando Pessoa. Questões sobre mulher e a educação colonial e a dos dias presentes até chegar às considerações sobre o nazismo e o holocausto, para lembrar apenas uma parte de sua produção intelectual.

Anita Novinsky partiu em julho de 2021 em sua última viagem, mas sua bagagem se mantém aqui na continuidade e aprofundamento de suas pesquisas e no debate com todas as outras visões historiográficas por uma geração de historiadores especializados em inquisição e Cristãos novos que ela formou em tantos anos de trabalho na Universidade de São Paulo, a “Escola Novinsky .

Publicou os seguintes inventários: Inquisição- Inventários de Bens Confiscados a Cristãos-Novos: fontes para a História de Portugal e do Brasil, seguido de Inquisição- Rol dos Culpados. Fontes para a Historias do Brasil, século XVI, Inquisição, Prisioneiros do Brasil (séculos XVI a XIX, Gabinete de Investigação- ¨uma caça aos judeus sem precedente e O Santo Ofício da Inquisição no Maranhão: A inquirição de 1731.

 

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